quinta-feira, agosto 03, 2006

GATO VELHO

De há uns anos a esta parte apreciava cada vez mais o sossego e o conforto. Poder passar horas a dormitar. Um prazer ainda maior que a comidinha farta a tempo e horas.
Aninhou-se no canto preferido do sofá por entre as almofadas, descontraído, e os olhos foram-se fechando lentamente.
Veio-lhe logo o perfume doce da Mãe. Que no princípio, há muito tempo, tivera uma Mãe. A gata mais linda que se possa imaginar, inteligente e protectora. Toda a vida sentiu saudades nostálgicas dela. A lingua vigorosa sempre atenta, quer para a higiene, quer para os mimos, as patas meigas e aquele miar suave que ainda lhe ecoava ao longe, tantas vezes no coração. Que bom quando se enroscava nela e nos irmãos a fazer um novelo compacto de criaturas peludas e gordinhas de olho brilhante. E o leite quente, tão saboroso a saber a transfusão de vida. E os olhos amarelos grandes e expressivos, nos quais se reflectia um mundo protegido e debroado de amores de gata Mãe. Nada melhor que dormitar ruminando a omnipresença da Mãe...
Um barulho familiar de chave na porta da rua trouxe-o de volta dos sonhos bons. Saltou para o chão e lá recebeu o Amigo, de cauda no ar, todo contente. Era um velho gato feliz.
História e fotografia do Gatopardo - 2006

9 comentários:

escorpiaotinhoso disse...

Julie,

São afectividades escritas de um gato com coração...

Gatopardo

Meow disse...

O teu texto fez-me pensar na separação! É uma tristeza alegre...

escorpiaotinhoso disse...

Meow,

Depende do tipo de separação, mais que uma tristeza alegre o que é por si um paradoxo, pode ser um alívio... Em relação aos gatos sei que eles são sensiveis uns em relação aos outros. Um dos gatos meus conhecidos, por exemplo emdada fase da sua vida andou tristíssimo quando a Mãe morreu. Sentiu muito a falta dela. E não é caso único...

Gatopardo

Alexa disse...

Que texto maravilhoso, ET!

É bem verdade que os gatos, também, sentem a falta da Mãe!
O Tristão, um dos filhos da Maruska (a gata de casa da minha mãe que teve de ser eutanasiada), apesar de ter já 11 anos, sofreu imenso quando viu a minha mãe e irmão regressarem a casa com a transportadora e sem a sua mãe.
O mesmo se tendo passado com a Selma, gatinha que a Maruska adoptara completamente, quando lá foi para casa.

É essa sensibilidade dos felinos que também me atrai bastante!

escorpiaotinhoso disse...

Alexa,

É muito verdade o que tu dizes. Os gatos têm snetimentos e alma, no sentido filosófico da coisa, que o religioso fica-se pelo Egipto faraónico. E depois há uns ignorantes atrevidos que vêm dizer que os animais são irracionais...

Gatopardo

escorpiaotinhoso disse...

Zeni,

Aqui os mais velhos têm 17 e 14 anos e estão bem... Estou aqui agarrado ao teclado rodeado de 4 gatos dorminhocos estiraçados no sofá adjacente. Falta um que estará por aí algures... Valem pelo encanto que proporcionam, mesmo os comentários desagradáveis, como aconreceu ontem aqui com uma visita que simpaticamente disse:

- Credo tens a casa cheia de gatos !!!! (e pensou, que grande porcaria..., ehehhe)

Gatopardo

Alexa disse...

ET, para comentários desse tipo, o melhor mesmo é o desprezo!
Há gente que não gosta de animais... coisa que eu, sinceramente, não compreendo.

escorpiaotinhoso disse...

Alexa,

O mais engraçado é que não sabem o que perdem...
O prazer que me dá a minha gata cinzenta horas a fio aqui à minha frente em cima do computador enquanto vou escrevendo, é a melhor das inspirações...

Gatopardo

Eurydice disse...

Poderão ser irracionais... :)) E isso que interessa? a razão não é tudo!...
O Horácio, quando veio cá para casa, foi bastante maltratado pela gata velha, que se assustava com a vivacidade dele e lhe dava sapatadas para o afastar. É preciso dizer que a gata velha, a Gipsy, cresceu sem mãe e temia todos os animais!... Mas passados dois anos, a Gipsy, doente com um tumor, estava muito mal, muito fraca e prostrada. Os outros não ligaram muito, mas o Horácio, quando percebeu, foi instalar-se ao pé dela, donde só saia para ir à casa de banho: durante dois dias, manteve-se ali ao lado dela, com um ar protector e firme. Até a Gipsy ser levada para a veterinária porque tinha chegado o fim.
Dão lições a muito ser humano!